Sunday, March 07, 2010

É tudo uma quetão de tempo menina

Alice, se te vejo alegre, se não a vejo com seus desenhos, se a vejo se afastar, se não consigo dizer-lhe, é por que no fim a deixarei nos braços de outro, e também por que sua alegria me incomoda, e também por que só consigo não ter.

Gostaria de ser como você, ter um corpo e o sexo enquanto amanhece, cheirando a álcool, cigarro e outros cheiros que agarram aos corpos depois de uma madrugada longa e perdida em bares, festas. Mas não sou assim.

Então vou explicar-me.

Amanheço antes de todos, durmo antes de todos, carrego pedras nas costas, fumo cigarros quando já não aguento mais, bebo sozinho em bares, olho as mulheres de longe, me sufoco com o ar que tento respirar. Sou pesado. Quando sorrio (e isso é raro) é uma careta, quando tento chorar, não consigo lágrimas (se bem que há pouco o meu joelho na mesa me fez sentir um pouco gente de novo), quando converso, é apenas por protocolo, quando beijo, minha saliva é de bocas que não existem mais.

Alice, quero beijá-la, fazer o amor com raiva ou carinho (a escolha é sua), mas não posso. Se fizer isso terei que guardá-la em uma caixa, trancá-la, por que só existo no passado e no futuro, num tempo teórico que inexiste e que exige a razão que destrói tudo. Para tê-la teria que ser no vivido, no presente, como fazem os vivos, mas esse tempo ainda não descobri onde fica, como se faz para chegar até ele (talvez uma vez numa piscina com um corpo boiando nos meus braços -talvez).

Menina, quero tê-la para mim, mas não posso pois vivemos em tempos distintos. Você tem o corpo, os sentidos, o vivido, eu tenho uma casca, uma dor de cabeça e uma vida que não pode ser vivida. Para tê-la eu teria que abrir um buraco no espaço, entortar a matéria e juntar os tempos. Mas acho que isso daria muito trabalho.

1 comment:

glaura said...

isso é bom, hein?